Sentir-se só mesmo acompanhado: o que essa solidão revela?
- Laura Helena Martins
- 29 de jul.
- 3 min de leitura
Atualizado: 31 de jul.
Sentir-se só mesmo acompanhado: o silêncio interno que ninguém percebe
Você está cercado de pessoas, conversa, ri, cumpre seus compromissos — mas, por dentro, sente um vazio difícil de explicar. Como se houvesse uma barreira entre você e os outros. Como se ninguém realmente te visse. Essa é uma experiência comum, embora muitas vezes silenciosa: sentir-se só mesmo acompanhado.
Essa solidão não é ausência de gente, mas ausência de conexão verdadeira — com os outros, mas também com você mesmo. E essa sensação, por mais desconfortável que seja, carrega perguntas importantes sobre autenticidade, liberdade e o que estamos buscando quando tentamos estar com alguém.
Neste texto, vamos refletir sobre esse tipo de solidão à luz da fenomenologia-existencial e do pensamento de Friedrich Nietzsche, que nos convida a olhar de frente para o vazio, para a solidão e para o desafio de ser quem se é em um mundo que nos empurra para sermos como os outros.
A solidão acompanhada: quando ninguém te alcança de verdade
Nem sempre estamos sozinhos de fato — mas ainda assim, nos sentimos invisíveis ou desconectados. Isso acontece especialmente quando não há espaço para dizer o que se sente, quando precisamos manter aparências ou quando percebemos que os vínculos estão superficiais.
Essa solidão pode se manifestar assim:
Sensação de incompreensão, mesmo entre pessoas próximas;
Dificuldade de se abrir por medo de não ser acolhido;
Desconforto em ambientes sociais, mesmo sem motivo aparente;
Percepção de que você precisa esconder partes de si para manter relações.
Esse tipo de sofrimento emocional pode nos fazer duvidar do nosso valor, das nossas relações e até da nossa própria sensibilidade. Mas e se isso não for um defeito, e sim um sinal de que você está sentindo falta de algo mais autêntico?
Nietzsche e a solidão como espaço de transformação
Para Nietzsche, o processo de se tornar quem se é exige atravessar a solidão. Ele dizia que o ser humano que busca viver de forma autêntica muitas vezes precisa se afastar das massas — dos padrões, das opiniões prontas, das relações rasas — para escutar a si mesmo.
Nietzsche via a solidão como possibilidade de criação. Uma fase onde deixamos de viver pelo olhar dos outros e começamos a construir algo próprio.
Na lógica social, estar com pessoas é sinônimo de sucesso emocional. Mas Nietzsche propõe o contrário: só é possível estar com o outro verdadeiramente quando aprendemos a estar conosco — com nossas perguntas, contradições e desejos reais.

Inclusive, ao digitar ''sozinho'' nos bancos de imagem online, recebi várias opções de fotografias em preto e branco e com pessoas com aparência triste, indicando o quanto está enraizado na nossa cultura a ideia de que estar sozinho equivale a estar mal, ao invés de possibilidade de criação. Portanto, escolho essa imagem, com uma flor em destaque, seja pela forma, seja pela cor, como ilustração para a autenticidade.
A quem você está tentando agradar? E o que você está tentando esconder?
Algumas perguntas podem abrir caminhos:
Você se sente livre para ser quem é nas suas relações?
Já percebeu que, mesmo acompanhado, está atuando um papel?
Quais partes de você ainda não têm espaço para existir com liberdade?
A solidão pode não ser o fim de um ciclo, mas o início de uma busca honesta por presença — não qualquer presença, mas a sua.
Psicoterapia: um lugar onde você não precisa se encaixar
A psicoterapia pode ser o primeiro espaço onde você não precisa se explicar. Um lugar onde o silêncio é escutado, onde o incômodo é bem-vindo, e onde a sua presença não precisa ser negociada para agradar ninguém.
Na terapia, você pode:
Compreender as raízes dessa solidão acompanhada;
Se escutar com mais profundidade, sem julgamentos;
Refletir sobre o que deseja das suas relações e da sua vida;
Cultivar vínculos mais verdadeiros, partindo do que é real em você.
A psicoterapia pode te ajudar a fazer dessa solidão um caminho de reencontro com sua própria existência. Porque, às vezes, sentir-se só é o que antecede o momento mais importante da vida: o reencontro com quem você realmente é.